Fabio Duarte
Exposição retrata memórias e desigualdades vividas pelo povo negro no RS.

Pinturas são retratos e paisagens sobre o povo negro e sua realidade no RS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Débora Fogliatto
Há mais de 15 anos, José “Zé” Darci descobriu-se pintor. Ele, que já
desenhava desde criança, realizou um curso de artista plástico em
Pelotas, onde vive, e se especializou no ofício. Mas foi apenas dois
anos depois que ele passou a perceber-se e trabalhar como um artista
plástico negro, a partir de contato feito pelo próprio movimento negro
da cidade do sul do estado. As pinturas feitas ao longo de sua carreira
foram reunidas na mostra “Memória e Identidade: Uma visão africanista”,
exposta desde a última terça-feira (12), no Memorial do Rio Grande do
Sul e Museu de Direitos Humanos do Mercosul, em Porto Alegre.
A partir de 2002, Darci começou a frequentar palestras e reuniões,
aproximando-se do movimento negro. “Por participar de muitas
conferências, palestras, comecei a ver a questão social e da
desigualdade e a refletir. Comecei a pintar a questão da necessidade, da
favela. Não são imagens bonitas de se ver, mas entendi que como artista
do século 21 teria que deixar retratado o nosso momento. Alguém teria
que fazer do feio a obra de arte, passar uma mensagem”, relata o
artista.
Nas obras expostas, essa conotação política e social fica evidente.
Há telas que retratam quilombos, favelas, desigualdades, além de um
Cristo negro e retratos. Uma das obras é denominada João Saudade, a
partir da música nativista que relata a história de um homem que saiu do
campo e veio para a cidade. “Porque, oh João/ Deixaste o galpão / E a
lida campeira/ Pra ser na cidade /Mais um João-saudade / Sem eira, nem
beira?”, questiona a canção, que Zé Darci diz não ter descoberto de quem
é a autoria. “Fala do homem do campo que veio à cidade grande e acabou
trocando seu cavalo e hoje se vê nas ruas da cidade puxando sua carroça
de papelão. Eu não sei quem é o autor, mas eu me apaixonei por essa
música e estava relacionada ao meu trabalho, à questão social”, relata.

“João Saudade” é baseado na música nativista | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
O trabalho remete ao negro gaúcho, segundo explica ele, não apenas
com o João Saudade negro, mas também com detalhes dos ambientes das
pinturas. “As obras mostram nossa região como ela é. Na questão das
favelas, por exemplo, não as mostra como montanhas, eu mostro as favelas
da nossa região, que são planas”, descreve.
A partir de um projeto da Universidade de Pelotas em parceria com o
Ministério da Educação para implantar o ensino de cultura afro nas
escolas, Zé Darci começou a viajar e conhecer a realidade de quilombos.
“Comecei a conhecer os quilombos, suas necessidades. A Baile dos
Defuntos foi uma história fenomenal contada realmente para nós por um
quilombola do interior de Piratini”, relata.
A exposição faz parte da programação do Fórum Social Mundial,
promovida pelo Memorial. A atual diretora do museu, Maria Helena Nunes,
já conhecia Zé Darci há cerca de seis anos, a partir de um projeto em
que ele retratava a história da Revolução Farroupilha até o Massacre de
Porongos. “Como diretora do Memorial, ela se interessou muito pelo meu
trabalho e me convidou para expor dentro do Fórum, porque tem tudo a ver
com discussões que são feitas”, aponta o artista.

Quilombos e trabalho no campo também aparecem nas obras | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Como a maioria dos eventos do FSM começam apenas no dia 19, Zé Darci
descobriu que “abriu o Fórum”, já que sua exposição começou antes dessa
data. “Eu tenho uma preocupação de que meu trabalho não passe
despercebido, que a pessoa possa criticar ou gostar, mas não ficar
indiferente”, resume.
SERVIÇO
O que: Memória e Identidade: Uma visão africanista
Local: Sala da Pintura – 2º andar – Memorial do RS, Rua Sete de Setembro, 1020.
Visitação: 13 de janeiro a 29 de fevereiro. De terças a sextas, das 10h às 18h, sábados e domingos, das 10h às 14h.
Confira mais fotos:

| Foto: Caroline Ferraz/Sul21

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fonte:http://www.sul21.com.br/jornal/exposicao-retrata-memorias-e-desigualdades-vividas-pelo-povo-negro-no-rs/